terça-feira, agosto 04, 2009


Margarida e o romance inacabado
Conheço a Margarida melhor do que ninguém. Muito melhor do que qualquer outra amiga, melhor do que a sua família, melhor até, estou segura, do que a própria mãe dela. A Margarida é a menina dos meus olhos e eu sei de toda a sua luz e de todas as suas sombras. Não, não estou a exagerar nem a armar-me em convencida.
Há amigas que julgam conhecê-la apenas porque ela lhes faz confidências de vez em quando. Desenganem-se. A Margarida não conta os seus segredos às outras amigas. Pelo menos os segredos-segredos, aqueles que são mesmo secretos. O que ela confidencia às amigas, são pequenos desabafos, pequenos aborrecimentos, pequenas dificuldades. A Margarida é um livro aberto, dizem elas, conta-nos a sua vida toda.
Mentira. Puro engano. O que ela diz a uma é o que diz a todas, é o que toda a  gente sabe ou adivinharia ainda que ela não contasse palavra. Um segredo que toda agente conhece é um não-segredo. Segredo verdadeiro é o silêncio, a não-palavra. Segredo é aquilo que alguém não diz e que outro adivinha, é o que é hermético, oculto, velado. O que a Margarida conta às amigas são histórias.
Já eu, eu leio na Margarida. Decifro a linguagem das suas águas claras, a severidade das suas águas escuras e profundas, a alegria do seu riso, a angústia da sua alma em chamas. Para mim, a Margarida é um romance inacabado, mas adivinho sempre o destino que ela vai dando aos personagens da sua vida, o próximo twist que ocorrerá nas suas acções, a forma como dará início ao capítulo seguinte. Adivinho porque sim, porque sei da Margarida como sei do meu próprio ser. Basta-me olhá-la nos olhos, ela que é a menina dos meus olhos, como já vos disse tantas vezes.
As outras, as amigas, pensam que sabem muito, que sabem tudo, mas sabem apenas das aparências ou não sabem nada de nada. Sabem de histórias da Margarida.
Mas não pensem que vou aproveitar para aqui fazer revelações acerca da Margarida. Ela nunca me perdoaria e eu própria seria incapaz de a trair. É o nosso pacto, o nosso acordo, feito de gestos desenhados no silêncio, de muitos momentos a sós com nós próprias, de uma extrema confiança.
- O que é que pr´aí a escrevinhar?, pergunta-me a Margarida.
- Nada de especial... apenas um segredo meu.

domingo, agosto 02, 2009