terça-feira, outubro 10, 2006












Estava escrito


A Margarida escolheu nascer numa casinha branca, que ficava na rua principal da sua aldeia. Isto não deve ter sido apenas coincidência, porque mesmo, mesmo em frente, vivia o Senhor Carlos Veterinário, no andar térreo e, no primeiro andar, ficava a casa da Dona Isabel, a Senhora Professora da escola dos meninos grandes.

Digo que não deve ter sido mera obra do acaso , visto que a Margarida sempre gostou de animais e de livros. Penso que esse gosto , já lhe vinha possivelmente de outras vidas, de outros espaços, de outros tempos; duma altura em que nem a Margarida nem os seus pais se lembravam.
Sim, porque a Margarida poderia muito bem ter nascido noutro lugar qualquer. Talvez até em sítios mais bonitos e mais interessantes do que a sua aldeia. A Margarida poderia ter escolhido nascer no Casal dos Bravos, por exemplo, uma bela localidade rodeada de urze, de cheiro a mato e desses pinheiros bravos , que tinham dado o nome ao casal. Mas não...

Eu acredito que qualquer coisa se passou na cabecita daquela Margaridinha bébé, ainda muito muito pequenina, quase minúscula de tão pequenina. Algo inexplicável e maravilhoso que a levou à escolha desse particular local de nascimento.

A Margarida já amava as palavras muito antes de nascer; já sabia que o Senhor Carlos veterinário tinha na sua biblioteca montes de livros imensos, com muitas muitas folhas, cheios de letrinhas pequeninas e desenhos de animais de toda a espécie. A Margarida já sabia , que iria redescobrir o gosto e o cheiro dos livros na casa do Senhor Carlos. E como para poder ler as palavras, precisaria de aprender as letras, nada melhor do que ter ali mesmo à mão, a dois passos da sua casinha, a casa da Senhora professora e da sua paciente mãe, a Dona Hermínia. A Margarida escolheu nascer no sítio certo .

- Então? Soube que já te nasceu a menina. Não era lá para Janeiro?

- Era, disse o pai da Margarida, mas adiantou-se. Veio quase um mês mais cedo. Estava com pressa de nascer.

A Margarida tinha pressa de saber, de aprender o mundo, de folhear os livros, de decifrar as letras. A Margarida escolheu nascer muito pertinho das palavras.

1 comentário:

greentea disse...

As Margaridas tem sempre pressa de nascer - para aprender , para ler , para saber ...
e escolhem, claro, o sitio certo.

Nao foi o que tu e eu fizemos tb??